sábado, 17 de outubro de 2015
Talvez de noite
À minha volta tudo envelheceu
como se fosse eu, e no entanto
uma casa, ou um espaço em branco
entre as palavras, ou uma possibilidade de sentido.
Pois nada
surge com a sua própria forma.
Digo "casa", mas refiro-me a luas e umbrais,
a lembranças extenuadas,
às trevas do corpo, lúcidas,
latejando na obscuridade de quartos interiores.
E digo "palavras" porque
não sei que coisa chamar
à mudez do mundo.
E digo "sentido" sufocado
sob o pensamento
tentando respirar
a golpes de coração,
agora que se desmorona a casa
sobre todas as palavras possíveis.
(Talvez de noite, Como se Desenha uma Casa, Manuel António Pina, in Todas As Palavras, poesia reunida)
.
Nocturno no.20 B49, F. Chopin (Maria João Pires)
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Poesia Manuel António Pina
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11 comentários:
António Pina
uma referência
que liberta
Bj
Saudades de Manuel António Pina! A sua excelente poesia com os seus leit motiv - as "palavras" e a "casa".
Beijinho
Tudo envelhece, sim. O corpo, as casas, o jardim. Que o coração se mantenha jovem até deixar de bater.
Um abraço, Justine.
"A grande Noite sempre esteve
mas não era em nós porque a recusávamos.
Éramos jovens porque também eram jovens as coisas antigas que conhecíamos.
Desde quando nos doem as mãos geladas
e porque é que isso ganhou importância agora?"
Amanhã é o 3º aniversário do seu falecimento.
Beijinho
A noite e as sombras da vida, um bom tema para desarrolhar.
Belo poema!
Abraços de vida, querida amiga
~~~
~ É tudo tão transitório, tão breve!
~~~ Excelente semana, MJ.
~~~~~ Beijinhos. ~~~~~~~
~~~~~~~~~~~~~~~~~
PA LA VRAS belas que encontrei aqui!
Beijinhos
Bia
www.biaviagemambiental.blogspot.com
Que saudades esse poeta deixou!
Bjs
Belíssimo este poema.
Há que recolher cada palavra e por palavra digo sinais que nos marcam.
Muito linda.
Abraço.
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