A árvore é tudo o que falta no céu
quando a contemplo.
Aconteceu há muito no recato
do meu livro de espantos e ternuras.
Tudo o que eu fizer, árvore,
será com a caligrafia dos teus ramos
bebedores de azul, da altíssima vibração
do azul na névoa das manhãs.
Ninguém conhece o teu perfil
quando os meus olhos não te alcançam
ou te desvias do meu corpo.
Os teus braços dizem berço e abraço
de outros braços de susto e perdição.
Por certo em teu redor dançaram maldições,
assobiaram pragas, esconjuros.
Assim fazem os néscios a quem
dá sombra ao verão e lenha ao frio
e poiso às aves de qualquer estação.
Inúteis ameaças.
Em minha nuca a tua seiva escorre.
Árvore que eu invento nunca seca.
( in Os Sítios, Licínia Quitério, edição de autor)
.
Valsa para piano nº7, Op.64, F.Chopin (V.Ashkenazy)