Visitou-nos duas noites, vinda do jardim onde guardamos imaginações.
Olhou-nos com olhos semelhantes a horizontes, onde se lia um traço de solidão. Ouviu a nossa saudação como se não soubesse da ruptura entre natureza e cultura, e depois, suavemente, partiu, com um ruído manso de asas.
Visitei-o, este jardim onírico e lúdico, por recomendação amiga e na companhia de amigos. Em boa hora. Dentro de mim, a saltitar, andou na visita a criança que fui e que ainda se deixa surpreender.
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Le Carnaval des Animaux:les fossiles, C.Saint-Saens
Enquanto houver um homem caído de bruços no passeio E um sargento que lhe volta o corpo com a ponta do pé Para ver como é; Enquanto o sangue gorgolejar das artérias abertas E correr pelos interstícios das pedras, Pressuroso e vivo como vermelhas minhocas despertas; Enquanto as crianças de olhos lívidos e redondos como luas, Órfãs de pais e de mães, Andarem acossadas pelas ruas Como matilhas de cães; Enquanto as aves tiverem de interromper o seu canto Com o coraçãozinho débil a saltar-lhes do peito fremente, Num silêncio de espanto Rasgado pelo grito da sereia estridente; Enquanto o grande pássaro de fogo e alumínio Cobrir o mundo com a sombra escaldante das suas asas Amassando na mesma lama de extermínio Os ossos dos homens e as traves das suas casas; Enquanto tudo isso acontecer, e o mais que se não diz por ser verdade, Enquanto for preciso lutar até ao desespero da agonia, O poeta escreverá com alcatrão nos muros da cidade:
ABAIXO O MISTÉRIO DA POESIA. . António Gedeão, Obra Poética . Nocturno Nº20 "Reminiscence",Chopin (MªJoão Pires)