Receita para fazer um herói
Tome-se um homem,
Feito de nada, como nós
E em tamanho natural.
Embeba-se-lhe a carne,
Lentamente,
Duma certeza aguda, irracional,
Intensa como o ódio ou como a fome.
Depois, perto do fim,
Agite-se um pendão
E toque-se um clarim.
Serve-se morto.
.
Reinaldo Ferreira
(in Poemas, Livro I, Um voo cego a nada)
.
Nocturno Op.32, No.9 (Il lamento e la consolazione), F. Chopin (Maria João Pires)
16 comentários:
Uma poema de denúncia que tão importante foi nos anos de chumbo e que continua...
Tão actual!
Beijinho
Forte, mas belo e verdadeiro.
A música atenua...
Muito belo e duro.
Beijinho e b.f.s.
Parece-me que é mesmo assim!
Bjs
O último verso dá-nos um murro no estômago! (E temos levado tantos!)
Beijo, Justine.
Ao arrepio dos pássaros
Bj
Há uma palavra caída em desuso que agora voltou a ser sinónimo: mártir.
Mas o proselitismo da nova ordem mundial tem outras.
Fez-me lembrar o American Sniper
Boa seman, Justine
demasiado intenso, agudo e irracional .
Dói com ou sem clarim.
numa época em que se mata por tudo e por nada, por ciúme, inveja ou apenas porque sim ...
(gostei do "serve-se morto") Heróis vivos já não há?
Uau! Isso rende livros e livros.
Abraço.
Triste mas real. É como greentea comenta - numa época em que se mata por tudo e por nada. Obrigada pela música a adoçar a leitura.
Belo contraluz para um poema que se lhe adequa... quanta beleza!
Besos y añoranza
Um belo poema, sem dúvida.
Mas perdoe-se-me sentir que, assim, também é um modo redutor de se ser (ou ter) um herói!
abraço, Zé!
Gosto muito deste poema, assim como de toda a poesia de Reinaldo Ferreira. Diria que é um poeta do absurdo, tão profundo em tudo que diz. Só não entendo como é que com uma obra destas, aparece o seu poema Uma Casa Portuguesa! É que não parece criação da mesma pessoa, de tão diferente e divergente do seu estilo. Alguém quer comentar?
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