domingo, 28 de setembro de 2008

Símbolos

Aproximação fugaz ao sonho e à promessa de partida, o rio está para além da beleza: é horizonte insondável, é mito e símbolo.
Da ponte, diria que continua a ser um traço-de-união.

quarta-feira, 24 de setembro de 2008

Sem corpo

A roupa destituída de corpo. Do corpo que escondia os afectos. Dispensáveis. Dispensados. Desaproveitados. Como uma roupa sem corpo.
Invisíveis, aves de rapina sobrevoam Callas, a traída.
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(após visita à decepcionante exposição, e parafraseando uma amiga poetisa)

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(Bill Evans, When I fall in love)

domingo, 21 de setembro de 2008

Sobre a sombra




Era Setembro, era onde a sombra roi os ramos. Os corpos são mais jovens nestas dunas, e só os jovens nos podem ensinar. Por isso os procuramos, e a pergunta é sempre a mesma - como se morre? Envelhecer não é assim tão simples, por mais que digam. Quantos dias de sol o declínio nos reserva? Por quanto tempo poderemos amá-los, a esses jovens, sem os ofender? Esta alegria de noutros corpos sermos ainda alguma juventude, como guardá-la, sem a degradar?


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(Eugénio de Andrade, in Memória doutro rio)

sexta-feira, 19 de setembro de 2008

Sesta com saudação ao sol

Olá donaminha, anda aprender comigo algumas posturas de yoga, especiais para antes da sesta

Primeiro, uma torção para a esquerda
Depois, uma torção para a direita - fazem muito bem aos músculos da cintura

Por último, uma flexão para a frente, com uma ligeira elevação do tronco para não cansar
Vês como já começo a estar descontraído?
Agora o relaxamento final, com uma pequena meditação.

RonRonRon... até logo, donaminha. Acorda-me para o lanche, por favor.


terça-feira, 16 de setembro de 2008

BACO




Andava por ali o deus das Uvas.
Por trás de cada cepa se ocultava.
Tinha os pés disfarçados em raízes
que prendiam a terra virilmente.
Tinha os olhos nos cachos reflectidos.
E a firmeza das parras acusava
que escondiam seu sexo omnipotente.



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Sebastião da Gama, Cabo da Boa Esperança




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(Blue in Green, Miles Davis)

domingo, 14 de setembro de 2008

Album de fotografias



Este ano despediram-se num adeus discreto e doce e partiram ao começo da manhã, em silêncio, poupando-nos a lacerações e melancolias.


Na nuvem onde embarcaram vai permanecer a promessa do seu regresso breve, e nas paredes ficará guardada a representação da sua ausência, que iremos visitar de vez em quando, como quem visita um álbum de fotografias.

quarta-feira, 10 de setembro de 2008

Jardins sem dono

Um azul improvável


Um rosa pintado à mão
um vermelho-papoila
Um branco todas-as-cores

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E assim crescem por aí, sem jardineiro, com a liberdade a adubá-las. Que mais é preciso?





segunda-feira, 8 de setembro de 2008

As nuvens



Por momentos dançam nas colinas
ou nos olhos das rolas:
vão para o sul, procuram
a luz molhada das ilhas,
os minúsculos pés da chuva,
a crepitação do mar,
o cheiro juvenil da lenha
ainda verde e com resina,
a alma das pequenas praças,
os pardais, o sussurro das matinas.

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(Eugénio de Andrade, in Rente ao Dizer)
(fotos cedida por Mia)

quinta-feira, 4 de setembro de 2008

Liberdade

Além, no azul, voa um bando de aves irreverentes e livres, desenhando ondas em contra-luz.
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(assim será, durante todo o fim-de-semana)